O tema concernente à delimitação dos contornos da base de cálculo do ICMS, cuja função é dimensionar a expressão financeira do fato tributável, constitui matéria constitucional, segundo consignado no AI 767.105, Relatora Min. Cármen Lúcia, mesmo porque “a base de cálculo não pode estar dissociada do aspecto material do fato gerador, havendo de consistir numa perspectiva dimensional apta à redução desse aspecto material a uma expressão numérica” (RE 167.992, Pleno).
Os serviços de comunicação, cuja prestação inscreve-se no âmbito da incidência do ICMS (CF, art. 155, II), acham-se envoltos com a oferta de uma série de outros serviços relacionados, que os complementam e que com eles mantêm um nexo de acessoriedade e dependência, e aos quais se subordinam, motivo pelo qual não podem ser prestados de forma autônoma e dissociada do serviço a que aderem.
Com efeito, os serviços relacionados à prestação de serviço remunerado de comunicação não constituem objeto principal do contrato de prestação de serviços de telefonia, mas são dele dependentes, circunstância que possibilita a inclusão das tarifas correspondentes na própria conta de telefonia emitida pela concessionária, a quem, e não a outrem, cabe colocá-las à disposição do assinante.
No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, acabou consolidando-se a jurisprudência na compreensão de que as tarifas cobradas pela concessionária de telefonia a título de habilitação, assinatura e de serviços suplementares, não seriam tributadas, pois não se inscrevem na descrição do fato gerador do imposto, de que cuida o art. 2º, III, da Lei Complementar 87/96, por constituírem supostas atividades-meio, preparatórias ou de natureza intermediária à prestação remunerada do serviço de telecomunicação, funções essas que, de resto, em verdade não desempenham e nem chegaram a ser demonstradas.
O mesmo tratamento dispensa-se aos serviços suplementares (Identificador de Chamadas, Transferência de Chamadas, Atendimento Simultâneo, Conferência, Consulta e Transferência, Despertador, Discagem Abreviada, Mais Minutos, Hora Certa, Aluguel de Equipamento para acesso a determinadas utilidades, bloqueio de DDD e DDI, Secretária Eletrônica, etc.), que, sem dúvida, agregam valor à prestação dos serviços de comunicação, muito embora sejam remunerados por um componente tarifário específico.
Induvidosamente, a Constituição Federal, ao outorgar aos Estados e ao Distrito Federal competência para instituir imposto sobre a prestação de serviço de comunicação (art. 155, II), já fornece a tônica indicativa da hipótese de incidência do ICMS, e, ao mesmo tempo em que esgota o enunciado de sua hipótese descritiva, delimita o aspecto material do imposto, ao definir aquilo que é essencial no fato descrito pelo legislador, a ser considerado pelo intérprete e pelo aplicador da lei.
Ao excluir todo um universo de componentes tarifários do campo de incidência do ICMS, ao fundamento de que a prestação dos serviços a que correspondem não constituiria fato gerador do imposto, não atentou a jurisprudência para a imperiosa distinção entre a descrição do núcleo da hipótese de incidência do ICMS e a definição de sua base de cálculo - considerada a inegável importância de que se reveste a distinção entre o descritor (o antecedente) e o prescritor (consequente) da norma, formulada pela lógica jurídica.
Com efeito, à hipótese - segundo o magistério doutrinário de Souto Maior Borges (Lançamento Tributário, Malheiros, 2ª ed., p. 149) - incumbe apenas descrever os pressupostos fáticos necessários e suficientes para a incidência da norma tributária, pelo que, como descreve e nada prescreve, a ela não cabe a determinação do quantum da prestação tributária e, pois, dos seus requisitos de quantificação (base tributável e alíquota), que estarão localizados no consequente (prescritor).
Afasta-se, por isso mesmo, a aventada possibilidade de introduzir-se na hipótese de incidência do imposto os serviços impropriamente rotulados de atividades-meio, pois, realmente, não se inscrevem no descritor da norma.
Isso, entretanto, não significa que as tarifas cobradas pelos serviços relacionados à prestação remunerada de telefonia seriam indiferentes para efeito de determinação do valor da obrigação tributária correspondente, eis que, como o serviço de comunicação pressupõe todo um conjunto de atividades que possibilite sua prestação (Lei n.º 9.472/97, art. 60), as respectivas tarifas instituídas para suportá-las estarão seguramente compreendidas nas genéricas prescrições constantes dos artigos 8º, II, “b” e 13, § 1º, II, “a”, ambos da Lei Complementar nº 87/96.
Com efeito, segundo o que se infere do que ali se acha prescrito, tudo o que integra o preço do serviço integra a base tributável, como incremento de seu valor, razão pela qual deve ela compreender também o que mais for pago à concessionária por efeito dos demais serviços prestados ou colocados à disposição do usuário, sejam quais forem as rubricas sob as quais se acham lançados na nota fiscal/fatura emitida pela concessionária.
Sendo assim, a base tributável, no caso, não pode se circunscrever ao preço da tarifa devida pela prestação do serviço de comunicação, devendo compreender, também, todos os demais componentes do preço cobrado pela concessionária, contrapartida que são dos demais custos dos serviços por ela ofertados e utilizados pelo usuário do serviço.
Segue-se, então, que, tudo o que é cobrado em razão de um negócio jurídico único, passa também a integrar a base de cálculo do imposto; na dicção da lei complementar, como despesas acessórias, os demais encargos cobrados ou transferíveis aos tomadores de serviço, devem concorrer para a determinação da base imponível do ICMS.
Nesse contexto, para a formação da complexa base de cálculo do ICMS, devem ser consideradas também, além do valor devido pela prestação do serviço de comunicação, propriamente dito, as tarifas cobradas pelos demais serviços colocados à disposição do usuário, resultantes que são de um único negócio jurídico, pois tudo o mais que é pago por efeito da prestação dos serviços de comunicação deve integrar a base de cálculo do ICMS.
Do ponto de vista jurídico, essa referibilidade dos adicionais à prestação do serviço de comunicação decorre, simplesmente, da impossibilidade de se reconhecer e identificar um negócio – autônomo e independente – ao qual a prestação pudesse eventualmente se referir. A impossibilidade de demonstração da existência de um vínculo jurídico paralelo e distinto induz a presunção de conexão do pagamento ao serviço de comunicação prestado, consoante o magistério doutrinário de Geraldo Ataliba, externado em hipótese assemelhada (RDT, nº 41, 91/116).
Isso significa dizer que a base de cálculo do ICMS é o preço cobrado na fatura, por compreender, naturalmente, todos os custos incorridos por efeito do contrato de prestação do serviço de telefonia, pois, somente assim, a base impositiva do imposto estará guardando equivalência com a matéria tributável, fornecendo a exata medida da grandeza econômica do fato gerador a que corresponde e somente assim é atendida a correlação lógica que deve existir entre o fato gerador e o montante sobre o qual deve incidir o imposto, visto que o valor apurado por medição das ligações telefônicas concluídas, isoladamente considerado, revela-se insuficiente para traduzir o valor real da variada gama dos serviços prestados.
De resto, é de rigor a observância, no particular, das normas inscritas na lei complementar, mesmo porque, para a jurisprudência da Suprema Corte, revela-se inconstitucional a previsão em Constituição do Estado-membro que exclua os juros devidos nas vendas a prazo da base de cálculo do ICMS, pois tal iniciativa, à falta de previsão em lei complementar, equivaleria à concessão de benefício fiscal sem a observância do procedimento previsto no art. 155, § 2º, XII, "g", da CF (ADI/MG 84), pois, sendo único o negócio jurídico, a legislação do ICMS não diferencia as operações de venda à vista ou a prazo (AI 805.951, Rel. Min. Celso de Mello; AI 807.613, Rel. Min. Joaquim Barbosa; AgRg no Ag 488.717, Rel. Min. Gilmar Mendes; AgR-AI 453.995, Rel. Ricardo Lewandowski; RE 363.539, Rel. Min. Carlos Britto; AgRg -AI 289.724, Rel. Min. Néri da Silveira e AgRg -AI 228.242, Rel. Min. Carlos Velloso, inter plures).
E é o que se passa com o valor do frete, quando incluído no preço da mercadoria, ou a ele acrescido - seja ele efetuado pelo próprio remetente ou por sua conta e ordem (LC 87/96, art. 13, § 1º, II, "b”) - parecendo natural que assim seja, pois, se o comerciante vende com a obrigação de entregar o produto (preço CIF, custo, seguro e frete), óbvio que o preço será superior ao da modalidade FOB ("free on board" ou livre a bordo), razão pela qual o seu custo deve ser levado em conta para fins de cálculo e pagamento do imposto.
Do mesmo modo, quando mercadorias são fornecidas com serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios (CF, art. 155, § 2º, IX, "b"), o imposto, por expressa previsão constitucional, deve incidir sobre o valor total da operação, tal como decidido no RE 282.310 (Rel. Min. Moreira Alves) e AI 166.079-AgR (Relator Min. Marco Aurélio), entre outros.
A hipótese, em vista da similitude existente, reclama pelo mesmo tratamento que a jurisprudência dos tribunais de sobreposição dispensa a situações a ela perfeitamente equiparáveis, para efeito de emprestar um tratamento jurídico uniforme ao que é parelho, semelhante, uma vez que os supostos fáticos em que repousam são essencialmente iguais nos aspectos importantes e diferentes apenas nos aspectos secundários.
À vista de tais situações assemelhadas, inexistiria, então, qualquer razão lógica ou jurídica para que idêntico tratamento não fosse dispensado aos demais componentes da tarifa cobrada pela concessionária do serviço de telefonia. Com efeito, presentes os suportes fáticos comuns, a eles deveria ser dispensado o mesmo tratamento assegurado às operações equiparadas, mostrando-se, então, oportuna a aplicação da figura do precedente judicial, que, mercê de timbrar a interpretação dos sistemas do "Civil Law" e do "Common Law", consubstancia técnica de aprimoramento da aplicação isonômica do Direito, a recomendar, portanto, que, para "casos iguais", "soluções iguais" (RE 433.896, Min. Cármen Lúcia).
Pelo visto, a afirmativa de que os serviços conexos com a prestação do serviço de telefonia, colocados à disposição de seus tomadores no âmbito de um único contrato, não se inscrevem na materialidade da hipótese de incidência do ICMS revela-se irrepreensível, mas, daí, não se pode extrair a conclusão de que as tarifas correspondentes e destinadas ao seu custeio deveriam ser excluídas da base impositiva do imposto, uma vez que, integrando os custos do contrato de prestação remunerada de serviços de comunicação, devem concorrer para a determinação da base de cálculo do imposto.
De resto, não guardando a matéria qualquer pertinência temática com a ocorrência do fato gerador do ICMS e assumindo a delimitação da base de cálculo do ICMS contornos constitucionais, a palavra final sobre a inclusão dos demais componentes da tarifa de telefonia na base impositiva do imposto será dada pelo Plenário da Suprema Corte, quando concluir o julgamento do RE 572.020, Relator Min. Marco Aurélio.
(texto atualizado em 12/2011)
Procurador do Estado (MG). Ex-Procurador-Geral da Fazenda Estadual (MG)
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MIRANDA, José Benedito. Prestação de Serviços de Comunicação: Base de cálculo do ICMS Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 jan 2012, 08:37. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos /25744/prestacao-de-servicos-de-comunicacao-base-de-calculo-do-icms. Acesso em: 29 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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